Monday, December 20, 2010

O Manto, em Novas Mãos (2 Reis 2.1-14)

O rei Acabe tinha morrido. A despeito das veementes advertências do profeta Micaías, o rei de Israel, com o apoio de Josafá, rei de Judá,   havia declarado guerra à Síria, pela retomada de Ramote-Gileade. Antes de sua decisão, havia relativa paz em relação ao inimigo histórico.   Os detalhes que cercaram a morte de Acabe seguiram as palavras proféticas de Elias. Ferido mortalmente por uma flecha, disparada sem alvo específico, Acabe resistiu por algumas horas, mas, por fim, faleceu; o sangue acumulado em seu carro de batalha  serviu aos cães de Samaria. Após a sua morte, o declínio do poderio militar do Reino do Norte tinha se processado ainda mais velozmente. Os moabitas, e outros, que haviam  estado sujeitos a Israel já tinham reconquistado temporariamente a independência (2 Reis 1). Após o curto governo de Acazias, um outro filho de Acabe, Jorão, havia sido levantado como rei em Israel. Em meio a tal contexto, de convulsões sociais e transições políticas, uma outra sucessão,  muito mais importante para a condição espiritual do Reino, se confirmaria. Longe da projeção da corte, dois profetas, um em final de ministério e outro, ainda em início, andavam juntos.

“Quando estava o SENHOR para tomar Elias ao céu, Elias partiu de Gilgal em companhia de Eliseu. Disse Elias a Eliseu: O SENHOR me enviou a Betel,... O SENHOR me enviou a Jericó,... O SENHOR me enviou ao Jordão...” Essa Gilgal não era a cidade histórica dos tempos da conquista de Canaã. Ao deixá-la, os dois profetas caminharam aproximadamente onze quilômetros sentido sudeste e chegaram a Betel e então a Jericó, cidade bem próxima ao rio Jordão. A despeito da idolatria reinante, as três cidades sediavam escolas de profetas, provavelmente abertas por Elias, durante o seu ministério no Reino do Norte. Sim, os lugares de rebelião eram também as sedes da resistência. Reflitam:     No Reino do Sul, havia o templo edificado, e as ordens sacerdotais levíticas, estabelecidas, entretanto, em Israel, os profetas não contavam com o apoio de nenhum outra classe atuante de servos do SENHOR. Elias foi impulsionado a visitar os discípulos nos três centros, ciente de que estava na iminência de ser tomado pelo SENHOR. A peregrinação pela rota da ascensão, sem dúvida, permitiu que as escolas fossem confirmadas, em um processo semelhante ao adotado pelo apóstolo Paulo e companheiros em relação às igrejas nascentes(Atos 15.36-41).

Segundo o texto bíblico, Elias, por três vezes, insistiu com Eliseu a fim de que ele não o acompanhasse em sua rota final. No entanto, Eliseu, bem como os discípulos das escolas de Betel e Jericó, sabia que naquele mesmo dia Elias seria trasladado. Portanto, todos esperavam o momento terminante, mas, pelo menos a princípio, não sabiam que as expectativas eram comuns. Eliseu já havia acompanhado Elias por aproximadamente sete anos. Desde o dia de sua convocação, ele havia aprendido por observação, ou mesmo por imitação, as várias exigências e facetas da carreira de um profeta. Seus conhecimentos, por certo, já eram consideráveis, no entanto, o poder para exercer o ministério, poder semelhante ao de Elias, era algo que Eliseu ainda não possuía. Assim, Eliseu decidiu não se afastar de Elias, nem por um momento sequer,  pois esperava receber a herança de seu pai espiritual, a porção dupla destinada ao filho primogênito.
Quando chegaram finalmente ao Jordão, Elias tomou o seu manto, o mesmo que ele havia usado em Horebe e em Abel-Meolá, e o enrolou e bateu contra as águas do rio, ao que se abriram imediatamente. O manto, símbolo visível do ofício profético,  foi o veículo para a ação do poder do Espírito do SENHOR. O milagre tem muitas semelhanças com um outro, no qual um  profeta de Deus partiu as águas do Mar Vermelho; o objeto em suas mãos, no entanto, não era um manto, mas um...(Êxodo 14. 15-25). No primeiro caso, o mar foi aberto para uma nação, no segundo para dois servos de Deus, sob os olhares atentos de cinqüenta discípulos dos profetas.
Logo após a travessia,  Eliseu teve a sua chance; o seu pedido a Elias foi expresso: “Peço-te que me toque por herança porção dobrada do teu espírito.” Na verdade, segundo a linguagem do Antigo Testamento, o espírito de um homem não era o aspecto imaterial de sua existência, mas a expressão visível da presença do Espírito de Deus em sua vida. Assim, o espírito de Elias, buscado por Eliseu, era menos a soma das características da  própria pessoa de Elias e mais a evidência das ações e manifestações do Espírito em Elias. Portanto, o desejo de Eliseu    não era simplesmente ser duas vezes mais poderoso ou duas vezes mais popular do que Elias, mas sim ter os recursos espirituais suficientes para garantir o prosseguimento do ministério profético em Israel, sob a benção de Deus. Logo, Elias não poderia prometer algo que caberia apenas ao SENHOR definir. Porém, sob a inspiração do Espírito, ele propôs um sinal a Eliseu: Caso o suplicante discípulo o visse em sua ascensão, seu pedido seria confirmado.
Enquanto andavam, repentinamente, um carro celestial com cavalos flamejantes passou no meio deles e os separou. Elias então foi elevado ao céu, em um turbilhão! Sim, dessa vez, Deus estava no grande e forte vento. Eliseu impactado gritou: “Meu pai, meu pai, carros de Israel e seus cavaleiros!”. A expressão significava a constatação da importância de Elias como guardião do Reino de Israel. Diante da cena grandiosa, Eliseu rasgou as suas roupas em duas partes, tomou o manto que Elias havia deixado cair, o empunhou, o levantou e voltando-se ao Jordão, e como Elias poucos minutos antes, o projetou contra as águas. Diante das testemunhas da ascensão, perguntou: “Onde está o SENHOR, Deus de Elias?” Um sinal respondeu a pergunta: Eliseu fez o percurso de volta em solo seco. O primeiro milagre de Eliseu demonstrou que a partida de Elias não significava a partida do SENHOR de Israel, pelo contrário, o poder do alto seria revelado de forma ainda mais contundente por meio dele. Também pelo mesmo sinal, Eliseu, o filho de Elias, foi confirmado como o novo pai dos profetas de Israel.

Em muitos aspectos, a transição ministerial de Elias para Eliseu antecipa uma outra. Conseguem identificá-la? Pensem: A voz solitária do deserto, que clama por arrependimento, dando espaço à mensagem pública, que anuncia salvação.  As semelhanças são óbvias. Assim como João anunciou a chegada de Jesus, Elias chamou o seu sucessor; assim como o Espírito desceu sobre Jesus, ao ser batizado por João, Eliseu recebeu o poder para a carreira profética, quando o manto de Elias chegou em suas mãos.
O manto em novas mãos. Eliseu, e sua mensagem: Salvação para todos, em nome do SENHOR.  
Ernesto Ferreira Jr.

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